OEA alerta para critérios vagos sobre desinformação e vê risco à liberdade de expressão no Brasil

Relatório da OEA aponta falta de definições claras sobre desinformação e discurso de ódio no Brasil e alerta para riscos à liberdade de expressão, com recomendações ao STF e ao Judiciário.

Ryan Davi

12/26/20252 min read

Um relatório da Organização dos Estados Americanos (OEA), por meio da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), acendeu um alerta sobre a ausência de critérios objetivos para conceitos como “desinformação” e “discurso de ódio” no Brasil. Segundo o documento, divulgado nesta sexta-feira (26), o uso impreciso desses termos pode representar uma ameaça direta à liberdade de expressão no país.

O parecer é resultado da visita oficial de Pedro Vaca, relator especial para a liberdade de expressão da CIDH, realizada em fevereiro a convite do governo do presidente Lula. A missão teve como foco analisar o ambiente institucional e jurídico relacionado à liberdade de expressão, incluindo encontros com autoridades em Brasília.

No relatório, a CIDH reconhece que o Supremo Tribunal Federal (STF) exerceu um “papel fundamental” na investigação dos atos de 8 de janeiro, classificados como tentativa de golpe. No entanto, o órgão faz um alerta: medidas excepcionais devem ser temporárias. Caso se prolonguem, podem concentrar poder excessivo e criar precedentes que, no futuro, poderiam ser utilizados por regimes de viés autoritário.

Recomendações ao Judiciário e segurança jurídica

Entre as principais recomendações, o documento destaca a necessidade de decisões judiciais mais bem fundamentadas. A CIDH afirma que magistrados devem explicitar de forma clara os fatos, os fundamentos legais e a relação entre provas e normas aplicadas, evitando qualquer sinal de arbitrariedade. Para o órgão, não basta mencionar a possibilidade de restringir direitos; é essencial demonstrar, de maneira objetiva, a legalidade dessas limitações.

O relatório também critica o uso de conceitos considerados vagos, como “desordem informacional” e “informação gravemente descontextualizada”. De acordo com a CIDH, essas expressões não oferecem limites claros entre o que é lícito e ilícito, o que compromete a previsibilidade jurídica e pode abrir espaço para censura indevida.

Imunidade parlamentar e críticas a decisões judiciais

Outro ponto sensível abordado é a imunidade parlamentar. A relatoria defende que qualquer restrição ao discurso de parlamentares deve ser extremamente limitada e sempre submetida ao princípio da proporcionalidade, para não inibir a atividade política nem violar garantias previstas na Convenção Americana de Direitos Humanos.

O parecer menciona ainda casos relatados por parlamentares brasileiros, incluindo a condenação da deputada Bia Kicis e do senador Flávio Bolsonaro, que foram obrigados a indenizar em R$ 30 mil pela divulgação de um vídeo do então candidato Lula durante o período eleitoral. A decisão foi assinada pelo ministro Alexandre de Moraes, que classificou o conteúdo como desinformação.

Peso político do relatório

Embora não tenha força normativa, o relatório possui forte peso político. Para especialistas que acompanharam a visita da CIDH, as recomendações podem impactar a imagem internacional do Brasil e aumentar a pressão sobre instituições públicas para rever práticas consideradas incompatíveis com padrões internacionais de direitos humanos.

O documento reúne 22 recomendações e, segundo analistas, o simples fato de apontar falhas já indica que há preocupações relevantes quanto à liberdade de expressão no país. A expectativa é que o relatório sirva de base para debates legislativos e institucionais, além de reforçar cobranças futuras da OEA ao Estado brasileiro.